terça-feira, 27 de outubro de 2020

INCLUSÃO ESCOLAR: Porque aprender dá prazer.

 

Há quem fale

Que a vida da gente

É um nada no mundo

 É uma gota, é um tempo

 Que nem dá um segundo

                                                     Gonzaguinha

            Diz ainda o poeta que, apesar de tudo, “a vida é bonita e é bonita”. Em que os versos podem   afetar a professora, o professor em seu dia-a-dia, para se aproximar da vida dos alunos? Pensar essa relação com base em nosso fazer e no que podemos fazer. Como pode a poesia nos encantar, levando-nos a também encantar os alunos?

        O que podemos fazer, para que as pessoas redescubram o sentido e o valor da vida. A inclusão escolar pode apontar nesta direção? O fazer pedagógico abarca os aspectos inclusivos que são peculiares?  O direito à inclusão escolar que é uma conquista é compreendido?  É por isso e por muito mais que trago essa discussão – a valorização da vida e o direito de aprender perpassando pela “Inclusão Escolar”.

            Não basta incluir, representado pela matricula, mas necessário é provocar as aprendizagens escolares. E estas, por sua vez, são de nossa responsabilidade. Porque fomos nós que fizemos a escolha por esta profissão. Ela é árdua? Certamente, como toda profissão, que se preze também é. Se o bom médico é aquele que cuida e salva o paciente, o bom professor indiscutivelmente será aquele que ensina ao aluno, ancorado por uma boa didática, uma boa teoria como nos disse Paulo Freire.

       O desejo em compartilhar essas ideias foi motivado, pela morte de um aluno que tive o prazer e o privilégio de tê-lo, ainda que, por pouquíssimas vezes na sala de aula. Isso, fruto de minhas rebeldias. Uma rebeldia, no âmbito das diretrizes que orientam o funcionamento da escola. Logo se vê a relação curricular neste ínterim.  Não tem como falar de nossas experiências bem ou mal sucedidas, sem expor   nosso sistema escolar e isso representa a necessidade de sua reconstrução.

         A escola pública foi democratizada, mas ainda temos uma representação negativa, observada em falas que se amparam no senso comum, do tipo antigamente se respeitava o professor e se aprendia. Essa fala omite o contexto sócio-histórico, no qual tínhamos uma quantidade insignificante de escolas e a seleção dos alunos era realizada pelo seu ingresso. Tínhamos, portanto uma exclusão escolar institucionalizada. Retomei essa discussão do acesso à escola, para visualizarmos essa linha do tempo, na qual se encontra a educação escolar e a inclusão escolar e  por julgar, que a consciência do direito à  inclusão escolar com aprendizagem ainda precisa ser clarificada e, que a não clarificação desse objetivo afeta professores e alunos.  

        Volto ao motivo do desejo da escrita deste texto – a morte  do aluno - público da educação inclusiva, para dizer que o privilégio que ele me proporcionou servirá de estimulo para a luta e para a defesa dessa educação a qual por si já especial. Servirá para pensar profundamente no que foi feito e no que se deixou de fazer por você “EMANUEL”. Nas poucas conversas que tivemos, você me falava com propriedade de sua trajetória de luta pela vida, da hemodiálise, de como teria que se paramentar para enfrentar aquele frio, dos perigos que corria, das vezes que a pressão baixava e que os procedimentos te garantiam as melhoras. Falou-me do desejo de um dia poder também trabalhar naquela perspectiva.

       Falou-me que as vezes que não ia à escola era por preguiça, todavia discordei de você. Discordei com base no grande conhecimento que você já tinha e pude discordar com base no conhecimento didático necessário a ensinar. Você já era um adolescente. Assistia muitos  programas, compreendia com maestria tudo aquilo, toda aquela leitura de mundo, tal como nos ensina Paulo Freire. Portanto, era preciso que a escola lhe proporcionasse um ensino que se sintonizasse com teu mundo. Era preciso um ensino provocador, para superar todas as dificuldades e ir a escola, para aprender o que só na escola lhe seria possível, como nos ensina Gèrard Vergnaud e Esther Grossi. Assim, com certeza não terias – preguiça. A tua preguiça, não era  preguiça  era – falta. Nas poucas vezes que fostes à aula, pudesse ser afetado pela magia da história de Um Gigante, amigo das crianças. E dissestes para sua mãe: Dinomir, não sai da minha cabeça.

         Nossos poucos encontros foi fundamental e suficiente para  afirmar o quanto você seria capaz de aprender a ler e a escrever. O que me garante registrar parte dessa aprendizagem. Você nos deixou sabendo escrever seu nome completo, conhecendo e diferenciando desenhos, letras, números, textos, mas, ainda não havia comprovado nem completado a trajetória que te levaria a aprendizagem da leitura e da escrita. No entanto, teria sido tão prazeroso para ti.

       Por que não conseguimos te dá o prazer de aprender a ler e a escrever? O que nos faltou? Por que não conseguimos efetivar a sua inclusão? O que nos faltou para te afetar no aspecto frequência escolar? Temos aqui um débito profissional a ser reparado para com os EMANUEIS que virão. Que possamos, na escola, aproveitar todos os segundos que a vida nos proporciona. Que nosso fazer possa encantar. E que esse encanto cante a vida, para que ninguém mais diga: “Que a vida da gente é um nada no mundo”. Para que em meio às desigualdades sociais e a diversidade cultural, a leitura e a escrita nos possibilite compreender e ter esperança. E a inclusão escolar tenha o mais profundo sentido em nossas vidas.

Professora Ermelina Maria Palhares de Melo

Professora das redes municipal de educação de Macaíba-RN e de Natal-RN

E-mail: ermelinapalhares@yahoo.com

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Diga o que você achou sobre este artigo.